segunda-feira, 27 de julho de 2009

Na linha do ônibus

Por Juliana Marton

No ônibus, sacolejando de um lado para o outro, Antônio¹ luta para equilibrar-se. Com a expressão de poucos amigos, culpa o motorista e fala de sua falta de consideração para com os passageiros. No entanto, Antônio era o mesmo que pelejava para entrar no transporte, num empurra-empurra, e um tal de filho-de-não-sei-quem, coisa que minutos antes havia repreendido. A questão do transporte coletivo tem-se agravado. Além dos problemas físicos que se encontram, como o crescimento da procura do serviço e a complexidade do tráfego, ainda tem a educação dos usuários que é totalmente contraditória, visto que ao mesmo tempo em que repreendem seus companheiros de labuta, também agem com violência para com os mesmos.

Isso ainda acarreta num declínio da qualidade de vida dos motoristas, afinal, sentados o dia todo atrás de um volante, ouvem coisas e presenciam cenas que não fazem bem algum à sua saúde. Segundo estudos realizados em Belo Horizonte com motoristas de transporte coletivo pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), vários fatores influenciam diretamente na saúde psicológica e física dos motoristas. Um dos maiores problemas encontrados é o ruído. Em uma pesquisa feita pelo Ministério da Saúde verificou-se que, o nível de ruído, ultrapassa os 85 decibéis, nível máximo ao qual uma pessoa pode ficar exposta por 8 horas diárias. E ainda existem outros tipos de fatores desgastantes, como a alta temperatura e a iluminação excessiva.
Tudo leva o motorista a um nível de estresse muito alto, e ainda, às vezes, a conduzir o veículo de maneira agressiva, ora freando de maneira abrupta e atirando os passageiros uns contra os outros, ora acelerando subitamente e provocando um mal-estar geral. Como resposta, os passageiros passam a se comportar também agressivamente e a tratar ao motorista e às outras pessoas de forma ofensiva, gerando total desconforto entre todos dentro do ônibus. Os usuários do coletivo não se cansam de criticar o transporte, por isso, ou por aquilo, mesmo assim, recusam-se a fazer algo que torne a convivência, no mínimo, cordial.
O caso maior é que isso reflete diretamente no aproveitamento do trabalhador durante o dia de trabalho, afinal, não se pode esperar que desempenhe seu papel da melhor maneira em seu emprego, se logo pela manhã já se está estressado por conta de uma viagem desconfortável e, na maioria das vezes, longa. E, além do mais, depois de um dia de trabalho, provavelmente, nada agradável – em que só se quer chegar a sua casa – tem-se novamente que apanhar outro ônibus lotado, mal-cheiroso, e cheio de outras pessoas com o mesmo nível de estresse.
Entretanto, ainda existem fatores que amenizam em parte essa situação. Um exemplo disso é que há solidariedade dentro do coletivo. Apesar de tudo, as pessoas ainda se ajudam, oferecendo-se para levar o material de algum estudante, ou cedendo seu lugar a um idoso. Um estudo de psicologia feito pela Universidade de Brasília em 2001 analisou o comportamento dos usuários do transporte coletivo, e revelou que, de maneira geral, em 60% das situações criadas, a ajuda esperada foi recebida. O que, hoje, é um grande avanço, em vista da decadência do setor.
O que assusta ainda mais a população é o descaso dos governantes para com a situação. As linhas de ônibus não atendem totalmente à população, e ainda há a demora das viagens e as longas esperas em pontos de ônibus. É exatamente isso o que se percebe em Goiânia, onde o usuário tem que caminhar longos espaços até um local no qual possa apanhar um ônibus que o leve até o lugar mais próximo do seu destino. Além disso, ainda enfrenta grandes períodos de espera até que a linha aguardada passe. O que não é lá muito conveniente em certas ocasiões, nas quais têm-se que chegar logo ao local desejado.
É claro, que como país emergente, o Brasil está um pouco longe de alcançar o tipo de transporte coletivo desejado. Apesar de ser um direito definido por lei a todo cidadão, ainda não se vê saída prática para tal problema. Porém, existem alternativas pelas quais os passageiros podem optar para não saírem irremediavelmente prejudicados. Uma delas seria adotar a política da cordialidade, deste modo haveria uma mudança no ambiente do ônibus, do qual tantos necessitam para locomoverem-se.
O cidadão nunca irá apanhar o transporte na porta de sua casa, a não ser que o ponto da linha de seu ônibus seja em frente à mesma. Todavia, um transporte de qualidade é o que se espera de um país que almeja ser considerado desenvolvido. Enquanto isso, como usuário desse sistema falho de transporte, o povo continua batalhando, e lutando entre si.
¹ Nome fictício, para preservação da identidade.

Artigo elaborado em Março de 2008 e veiculada no webjornal Outr'Análise.

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