Por Juliana Marton
Diferente dos demais livros-reportagem, Os Estrangeiros do Trem N não foi feito com a intenção de publicação em um jornal/revista, senão um livro realmente. Como o próprio autor faz questão de esclarecer, o livro é um romance-reportagem, pois conta com a narrativa para trazer à tona a situação dos imigrantes ilegais em New York. Sérgio Vilas Boas mostra a dura realidade que os imigrantes brasileiros, e também os demais, mas de uma forma não tão detalhada, enfrentam a vida na Big Apple.
A trama gira em torno de dois personagens principais, que fadados ao fracasso em seu país de origem, no caso o Brasil, vêem-se obrigados a partir para uma nova perspectiva de trabalho. Eles se voltam para os Estados Unidos, terra dos sonhos e da liberdade. Entretanto, ao chegarem ao tão sonhado destino, eles se deparam com uma realidade totalmente diferente daquela idealizada. O autor mostra através de relatos como é a adaptação dos imigrantes ao novo estilo de vida.
Os personagens são dois homens que passam por uma situação muito complicada no Brasil. Numa tentativa desesperada, eles buscam refúgio e oportunidade nos Estados Unidos. Todavia, a trajetória deixa marcas profundas na vida de ambos. Angél Benadski e Plínio João – os nomes foram alterados pelo autor a fim de preservar a identidade das fontes – são exatamente retratos do brasileiro que enfrenta a falta de recursos financeiros e por isso almeja um salto de enormes proporções para si.
Angél é ex-combatente e embarca para os EUA com um passaporte comprado, em nome de Mauro Braga Pompeu. Diferentemente de seu futuro roomate (colega de quarto), Angél foi preso pelo INS, o serviço de imigração estadunidense, logo que chegou ao país. Foram quase oito meses na prisão de Elizabeth em New Jersey, nos quais Angél sofreu horrores nas mãos de uma empresa terceirizada que cuidava de maltratar todos aqueles imigrantes que, num quase sorteio, eram presos e mandados à cela.
Plínio João em contrapartida, não teve que passar por semelhante situação. Já que, como a maioria dos imigrantes que descem no aeroporto JFK, foi agraciado com um sorriso do funcionário do aeroporto. À espera de Plínio estava sua irmã, Iara, que havia decolado para os States há sete anos, e assim, já estava mais do que informada sobre todos os trâmites da lei norte-americana, e também como burlar toda a burocracia. Plínio teve toda a ajuda que poderia ter, o que nesse caso, como bem se observa no livro, é pouca, porém de notória diferença.
Os dois personagens passam por situações semelhantes quando ingressam de vez no mercado nova-iorquino. Angél, que foge da prisão, consegue de maneiras pouco claras alguns bicos até regressar à Big Apple. Já Plínio, por interferência da irmã, arranja um emprego de dish-washer (lava-pratos). Alguns meses mais tarde, ambos conseguem um emprego numa famosa garagem da cidade, a Park Plus. Plínio numa garagem melhor localizada, o que lhe garante uma renda maior, devido às gorjetas (tips) que recebe. Numa noite, Angél é transferido para a garagem em que Plínio trabalha e então os dois se conhecem. Vários eventos acontecem na mesma noite e acabam por aproximar os dois, que decidem por uma série de fatos, dividirem um apartamento.
A vida em New York é totalmente desmistificada pelo autor. É fato, e Sérgio Vilas Boas assume, que quando o estrangeiro quer e trabalha muito, consegue sim reunir uma boa quantia em dinheiro. Entretanto, o autor mostra que quanto mais dinheiro os imigrantes acumulam, mais presos a esse acúmulo eles ficam, tornando-se um círculo vicioso que amarra os estrangeiros ao novo país. Além disso, também fica claro que, mesmo no país dito de primeiro mundo, há ainda a miséria, a injustiça social, e uma sociedade totalmente alheia aos próprios problemas.
O livro é uma magnífica obra que apresenta ao mundo a situação dos imigrantes ilegais, seja nos EUA, ou em outro país. O que Vilas Boas expõe de fato, é a dura realidade enfrentada dia após dia por aqueles que, tendo em vista a mudança de status, optam pela mudança total de vida, e vão, na esperança de um futuro promissor, atrás de um sonho que muitas vezes não pode e não vai proporcionar nada daquilo com que tais pessoas sonharam para si.
É um livro contagiante, que prende a atenção do leitor do início ao fim, e que, apesar de ser uma “reportagem” – coloco aspas, pois é praticamente um romance – é uma leitura interessante e agradável de fazer. O que o autor fez, foi trazer da maneira mais conveniente uma realidade austera, porém de necessária discussão. Além do mais, os relatos trazidos pelo livro até nós, leitores, são totalmente vívidos e intensos, o que nos faz sentir e até mesmo nos perceber dentro de cada um dos personagens.
Resenha elaborada em Julho de 2008.
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