sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Reportagem - Novembro 2008

bullying
Isso não tem graça!
Quando as brincadeiras e apelidos passam a ser uma desculpa para a violência verbal e física, acarretando em problemas psicológicos a crianças e adolescentes vítimas da prática
Juliana S. Marton
Todos os dias crianças e adolescentes divertem-se criando apelidos uns para os outros. O problema é quando a brincadeira passa dos limites, e acaba virando uma humilhação constante e desregrada. A brincadeira que não tem graça, como ficou conhecida, é o bullying. A palavra “Bully” é de origem inglesa e significa “valentão”. A maioria das pessoas confunde ou interpreta o distúrbio simplesmente como o ato de conferir apelidos pejorativos às pessoas, associando a prática exclusivamente ao contexto escolar.
De acordo com a psicóloga Ângela Baiocchi, o distúrbio já não se restringe aos apelidos pouco amigáveis, mas tornou-se um ato de violência que foi gerado pelo modelo de sociedade que existe hoje. “É uma grande influência do ambiente social na questão da aparência. Hoje a beleza estética é o maior predicado que as pessoas devem ter, o que implica que elas devem ser sempre bonitas e perfeitas para serem aceitas”, explica. Em escolas a prática é comum. Os próprios professores contribuem para sua disseminação.
Segundo Sônia Lúcia Borges, coordenadora pedagógica da unidade sul do Colégio Prevest em Goiânia, os professores são orientados pelo colégio, mas as piadas acabam surgindo e incitando as brincadeiras dos alunos. Um aluno do colégio afirma que presenciou alguns casos na escola, e que considera a prática nociva. Ele já apelidou colegas algumas vezes, mas não considera que foi prejudicial, já que as pessoas-alvo não se sentiram ofendidas. O estudante garante que não eram pejorativos e que não havia intenção de prejudicar o amigo.
O bullying é uma agressão física, verbal e emocional quase diária, que inclui insultos ou até assaltos. O distúrbio é gerado, na maior parte das vezes, pelos preconceitos da sociedade, como o homossexualismo ou a condição social; e também pelo ideal de perfeição estética que a mídia prega. Para Ângela Baiocchi, a imaturidade também é um fator decisivo nesses casos, já que as crianças e adolescentes não sabem que esse tipo de comportamento e atitude traz conseqüências desastrosas para as vítimas.
Em todo o globo, estudos vêm sendo realizados a fim de averiguar quais as verdadeiras proporções deste mal que afeta grande parcela da população infantil. Em Portugal, por exemplo, em uma pesquisa realizada com cerca de 7 mil estudantes entre 6 e 16 anos, um em cada cinco alunos, o que representa 22% dos entrevistados, já foram vítimas do bullying na escola. O mesmo estudo mostrou também que o local preferido pelos valentões para a prática do bullying, são os pátios na hora do recreio, cerca de 78% dos casos.
No Brasil, a ONG Abrapia, do Rio de Janeiro, desenvolveu uma pesquisa com 11 escolas locais. O estudo revelou que cerca de 40% dos quase 6 mil alunos entrevistados estão envolvidos com esse tipo de violência, sendo autores ou vítimas dele. Em Goiás, de acordo com José Luís Domingues, superintendente de educação básica da Secretaria de Educação, não foi feito nenhum registro da incidência de bullying nas escolas. “Nós não temos isso registrado. Seria um desafio para as universidades estudarem esses casos”, assevera.
Enquanto isso, na escola...
Estudante e participante de muitas brincadeiras, Sérgio (o nome real foi suprimido) afirma que já sofreu com o bullying. Agora com 17 anos, lembra-se de que aos dez, vários coleguinhas de classe o xingavam. Segundo ele, quando a violência verbal não era o bastante para eles, o grupo partia para a violência física. Seus pais foram chamados à escola e os valentões punidos verbalmente. “A coordenadora chamou a atenção deles, e ainda lhes aplicou uma ocorrência”, lembra.
Por outro lado, mesmo já tendo saído, a universitária Larissa de Fátima recorda-se dos tempos de escola, quando ela e suas amigas implicavam com alguns colegas. Segundo a estudante de Direito, nunca houve casos de bullying explícitos nas escolas em que estudou, entretanto, considera a prática cotidiana em instituições de ensino. Além disso, Larissa afirma que as brincadeiras feitas em sala por professores podem incitar o comportamento. “Sempre tem professor engraçadinho que exagera na proporção”, assegura.
A psicopedagoga, Sônia Lúcia Borges, garante que a conscientização é a melhor estratégia para combater a prática do bullying. Ela afirma que, dentre os casos que acompanhou durante sua trajetória em escolas, o que provoca o comportamento é a não imposição de limites pelos pais. “A ética tem que ser trabalhada. Os pais não ensinam os filhos a terem respeito pela diferença, e isso gera esse tipo de comportamento. Eles devem ensinar seus filhos a terem limites”, indica.
Além disso, de acordo com Vanúsia Leal Andrade, coordenadora de um curso de psicologia escolar, os pais das crianças que são vítimas do bullying devem estar atentos, já que o problema prejudica o desenvolvimento da criança e do adolescente, tanto psicológica, quanto emocionalmente. Ela ressalta que o apoio da família é imprescindível para que a criança e o adolescente enfrentem o problema. “A família tem que acolher tanto o que pratica quanto o que sofre. No caso da vítima é fortalecê-lo para lidar com isso”, aconselha.

Para um convívio saudável:
1) Promover o debate em sala de aula, para que todos sejam conscientizados;
2) Os professores devem ficar atentos ao ambiente da sala de aula;
3) A escola deve estabelecer normas claras referentes ao comportamento dentro da própria instituição;
4) Desenvolver programas baseados no incentivo, não na repressão;
5) Orientar dos pais, para que fiquem atentos às mudanças de seus filhos;
6) Orientar as vítimas a evitar andar sozinhas e ter várias atividades fora da escola, para poder ter mais amigos;
7) Evitar confrontos, mas quando estes não puderem sem evitados, orientar as vítimas a terem uma linguagem corporal assertiva, ou seja, andar direito e confiante e olhar sempre em frente.

Perfis
Agressor:
- Geralmente são crianças arrogantes, conflituosas e competitivas. Os meninos praticam um bullying direto, ameaçando e batendo. Já as meninas praticam o chamado bullying social, feito através de ofensas, boatos negativos e rejeição.
Vítima:
- Qualquer criança pode ser vítima de bullying, mas aquelas que são diferentes, ou não se encaixam, são normalmente as mais martirizadas. A aparência física é o que desencadeia mais atitudes de bullying.

Reportagem elaborada durante a disciplina Laboratório de Jornal Impresso 1, em Novembro de 2008